Nos anais da cidade de Paris, há um inverno que se destaca pela sua intensidade e pelo seu frio recorde. Mas que inverno foi esse que marcou a história parisiense, deixando na memória colectiva histórias arrepiantes e recordações indeléveis? É uma questão intrigante que nos convida a viajar no tempo e a descobrir uma Paris congelada no gelo.
Este inverno histórico não é outro senão o de 1879. Um inverno que é recordado como o símbolo de uma provação climática sem precedentes. Em dezembro desse ano, as temperaturas desceram a níveis nunca antes registados. No Parque Montsouris, foi estabelecido um recorde absoluto com uma temperatura de -23,9°C. Este frio extremo não foi um episódio isolado; caracterizou todo o mês de dezembro da época, fazendo de 1879 o mês mais frio observado em Paris, em todos os períodos combinados, desde o início das medições meteorológicas.
Mais do que um recorde de temperatura, este frio excecional teve um impacto profundo na vida quotidiana dos parisienses. A cidade, conhecida pela sua efervescência e dinamismo, ficou paralisada. As ruas, normalmente cheias de atividade, transformaram-se em desertos gelados. Mercados, locais de encontro e actividades quotidianas foram perturbados por esta vaga de frio impiedoso.
O Sena, artéria vital da capital, não escapou ao frio intenso. Transformado num rio gelado, ofereceu um espetáculo simultaneamente magnífico e surrealista, testemunhando a força da natureza contra a qual até uma cidade tão grande como Paris parecia vulnerável. Este fenómeno raro deu origem a cenas únicas, que ficaram gravadas na história da cidade.
Paris: redescobrir as imagens da última vez que o Sena congelou
Atualmente, é difícil imaginar o rio que atravessa a capital congelado após dias de frio intenso. Mas a última vez que o Sena esteve coberto de gelo foi em 1956! Veja as fotografias. [Leia mais]
O inverno de 1879 foi também uma lição de resistência humana. Perante esta provação, os parisienses tiveram de dar provas de engenho e solidariedade para ultrapassar as dificuldades. Foi um período de desafios, mas também de adaptação e inovação, em que todos tiveram de encontrar formas de se manterem quentes, de se alimentarem e de continuarem a viver apesar das condições extremas.
Os invernos rigorosos não são um fenómeno novo para Paris. Em 975, a cidade esteve coberta por uma espessa camada de neve até maio (sim, sim!), o que provocou uma fome devastadora. Chegaram a ser avistados lobos na cidade e a neve chegava por vezes à cintura de um homem. Episódios semelhantes, embora menos extremos, têm-se repetido ao longo dos séculos, como em 1952 e 1963, reputados como o inverno mais longo do século XX.
A história de Paris é também pontuada por terríveis episódios de geada. Em 1407, a cidade conheceu um dos invernos mais frios da Idade Média, com 66 dias consecutivos de geada. O Sena congelou e o vinho nos barris também. As pontes Petit-Châtelet e Saint-Michel foram arrastadas pelo gelo.
Uma análise das temperaturas médias desde 1678 revela que o início do século XIX foi particularmente frio. Este período de arrefecimento começou na segunda metade do século XVIII. No entanto, após 1850, as temperaturas médias começaram a subir novamente, com os anos 90 a marcarem a década mais quente do século.
Anos como 1408, 1608, 1709 e 1830 são recordados pelo seu frio extremo. Estes Invernos, caracterizados pela sua duração e gravidade, tiveram um impacto dramático na vida dos parisienses, desde os bloqueios do Sena até à grave escassez de alimentos.
As consequências destes Invernos foram muitas vezes desastrosas. Os degelos provocavam inundações, danificavam pontes e afectavam as colheitas em Paris. A estes invernos rigorosos seguia-se geralmente a fome, como em 1684, quando as colheitas falharam de tal forma que até as famílias nobres foram afectadas.
Atualmente, com apenas alguns centímetros de neve, é difícil imaginar essas cenas invernosas de outrora. No entanto, ao explorarmos os arquivos, revivemos esses momentos históricos, oferecendo uma perspetiva única sobre a resiliência e a adaptação desta cidade eterna face aos desafios climáticos.
Fontes bibliográficas :
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